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terça-feira, 10 de novembro de 2009


E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.

Que estúpido se não sabe que a infelicidade dos outros é dele e não se cura de fora. Porque sofrer não é ter falta de tinta ou o caixote não ter aros de ferro!

Bendito seja eu por tudo o que não sei, gozo tudo isso como quem sabe que há o sol

Bom é que não esqueçais

Que o que dá ao amor rara qualidade

É a sua timidez envergonhada

Foi um momento

O em que pousaste

Sobre o meu braço

Temos, todos que vivemos,

Uma vida que é vivida

E outra vida que é pensada,

E a única vida que temos

É essa que é dividida

Entre a verdadeira e a errada.

Tudo o que faço ou medito

Fica sempre na metade.

Querendo, quero o infinito.

Fazendo, nada é verdade.

Ah, poder ser tu, sendo eu!

Põe a tua mão

Sobre o meu cabelo...

Tudo é ilusão.

Sonhar é sabê-lo.

Quanto mais claro

Vejo em mim, mais escuro é o que vejo.

Só a inocência e a ignorância são

Felizes, mas não o sabem. São-no ou não?

Que é ser sem o saber? Ser, como a pedra,

Um lugar, nada mais.

Quanto mais fundamente penso, mais

Profundamente me descompreendo.

O saber é a inconsciência de ignorar...

Não é a dor de já não poder crer

Que m’oprime, nem a de não saber,

Mas apenas completamente o horror

De ter visto o mistério frente a frente,

De tê-lo visto e compreendido em toda

A sua infinidade de mistério.

Quem pudesse gritar para despertarmos! Estou a ouvir-me gritar dentro de mim, mas já não sei o caminho da minha vontade para a minha garganta.

Custa tanto saber o que se sente quando reparamos em nós!... Mesmo viver sabe a custar tanto quando se dá por isso... Falai, portanto, sem repardes que existis... ...

Minha alma procura-me

Mas eu ando a monte,

Oxalá que ela

Nunca me encontre.

Sou um evadido.

Logo que nasci

Fecharam-me em mim,

Ah, mas eu fugi.

Triste de quem vive em casa,

Contente com o seu lar,

Sem que um sonho, no erguer de asa,

Faça até mais rubra a brasa

Da lareira a abandonar!

Sem a loucura que é o homem

Mais que a besta sadia,

Cadáver adiado que procria?

Quase que me perco a pensar o que isto significa,

Mas estaco, e sinto-me sorrir na noite com os cantos da boca,

Porque quem ama nunca sabe o que ama

Nem sabe porque ama, nem sabe o que é amar...

Para ser grande, sê inteiro

Sim, sei bem

Que nunca serei alguém.

Sei de sobra

Que nunca terei uma obra.

Sei, enfim,

Que nunca saberei de mim.

Sim, mas agora,

Enquanto dura esta hora,

Este luar, estes ramos,

Esta paz em que estamos,

Deixem-me crer

O que nunca poderei ser.

Niguém te dá quem és. Nada te mude.

Quer pouco, terás tudo.

Quer nada: serás livre.

O mesmo amor que tenham

Por nós, quer-nos, oprime-nos.

Que importa àquele a quem já nada importa

Que um perca e outro vença,

Se a aurora raia sempre

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.

Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.

Mais vale saber passar silenciosamente.

E sem desassossegos grandes.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança;

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança;

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem, se algum houve, as saudades.

Tricky


Amor um mal, que mata e não se vê;

Que dias há que na alma me tem posto

Um não sei quê, que nasce não sei onde,

Vem não sei como, e dói não sei porquê.

Transforma-se o amador na cousa amada,

Por virtude do muito imaginar;

Não tenho logo mais que desejar,

Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,

Que mais deseja o corpo de alcançar?

Amor é um fogo que arde sem se ver;

É ferida que dói e não se sente;

É um contentamento descontente;

É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;

É um andar solitário entre a gente;

É nunca contentar-se de contente;

É um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;

É servir a quem vence o vencedor;

É ter com quem nos mata lealdade.

Um gosto que hoje se alcança,

Amanhã já não o vejo;

Assim nos traz a mudança

De esperança em esperança

E de desejo em desejo.

Da alma e de quanto tiver

Quero que me despojeis,

contanto que me deixeis

Os olhos para vos ver.